A Arte do Vitral

        O vidro, colorido e transparente, é capaz de transformar um ambiente por meio de um processo sutil e unificador de transmutação do espaço interior. O vitral é uma arte ambiental que envolve o espectador ao criar uma atmosfera visual, vinculando-se, assim, com a arquitetura. Ligado, também, à memória e à tradição, o processo histórico, artesanal e tecnológico da técnica sobrevive e evolui, tornando o vitral o herdeiro atemporal da Idade Média.

Exemplo de vitral em Saint-Denis Abbey. 

        A presença dos vitrais nas edificações representa uma certa desmaterialização da arquitetura, transformando um modo de vedação prático em obra visual na transfiguração da presença da luz, modulando o espaço e as sensações dos indivíduos. O sistema do vitral permite a respiração interfacial entre o interior e o exterior, uma vez que impede o contato visual com o exterior ao mesmo tempo em que utiliza a luz externa para inundar o ambiente interno.

        A arquitetura moderna inova e estabelece com a história da arquitetura relações paradoxais, um fenômeno perceptível em inúmeros edifícios construídos no século XX no Brasil e no exterior. Em tais construções, a presença dessa linguagem estética tipicamente encontrada em arquiteturas antigas, o vitral, surpreende, levantando questionamentos nos âmbitos intra-artístico e histórico-crítico.

        No que diz respeito à produção do vitral, indaga-se se o saber-artístico centenário da montagem das peças coloridas de vidro emolduradas por fios de chumbo alterou-se entre as oficinas do século XIII e as do século XIX, XX e XXI. Já numa perspectiva temporal, o funcionamento do vitral ao longo das épocas e em diferentes culturas arquitetônicas e artísticas, como na cristã medieval, na muçulmana e na moderna brasileira, ressaltam singularidades únicas da finalidade e do uso do vidro num ponto de vista tipológico e casual.

        Dessa forma, uma investigação sobre a genealogia do vitral nos permite nortear o sentido da técnica e a sua contribuição histórica na arquitetura. A interpretação da presença de vitrais, notadamente no Modernismo Brasileiro, seus usos e suas significações, a maneira como se relaciona com exemplos históricos observados, além das inovações e das permanências, são pontos importantes de uma análise que permita a compreensão da persistência da técnica na atualidade.

        Para, portanto, examinar essa linguagem espacial e estética de origens antigas que sobrevive na modernidade, deve-se classificar as ressurgências dessa modalidade na cena artística-arquitetônica, se atentando para as origens da técnica, para as oficinas de  produção modernas e para as simbologias de uso. Assim, pretende-se concluir que as manifestações artísticas e arquiteturais, ainda que modernas e inéditas, sempre veiculam camadas de motivações e de determinações que as fazem ser parte de uma longa genealogia, construindo uma história e uma crítica da arquitetura mais dialéticas e menos lineares.

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